QUESTÃO CESPE - Administrativo - Comentários


(14) (CESPE-AGU-2010 - PROCURADOR FEDERAL) A anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, nos processos que tramitem no TCU, deve respeitar o contraditório e a ampla defesa, o que se aplica, por exemplo, à apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão.

Assertiva INCORRETA.

Inicialmente, para respondermos à questão, precisamos relembrar o conceito de “atos complexos”.

Atos complexos são os que resultam da manifestação de dois ou mais órgãos, sejam eles singulares ou colegiados, cuja vontade se funde para formar um ato único. O exemplo clássico é a confirmação da aposentadoria do servidor público pelo Tribunal de Contas.

Não se confunde com o chamado “ato composto”: enquanto no ato complexo fundem-se vontades para a prática de um único ato, no ato composto, praticam-se dois atos, um principal e outro acessório, que normalmente só o complementa.


Sendo assim, o ato administrativo complexo só se aperfeiçoa com a sua confirmação pelo segundo órgão, do qual se exige a manifestação autônoma de vontade.

É o que o ocorre no caso da aposentadoria do servidor público, que será inicialmente concedida pelo setor de pessoal do órgão, mas que dependerá da confirmação posterior pelo Tribunal de Contas.

Com base nesta premissa o STF firmou o entendimento de que o prazo decadencial de 5 anos para anulação do ato de aposentadoria (previsto no da L9784) só começa a contar a partir da homologação pelo Tribunal de Contas.

”O Supremo Tribunal Federal pacificou entendimento de que, sendo a aposentadoria ato complexo, que só se aperfeiçoa com o registro no Tribunal de Contas da União, o prazo decadencial da Lei n. 9.784/99 tem início a partir de sua publicação. Aposentadoria do Impetrante não registrada: inocorrência da decadência administrativa. 4. A redução de proventos de aposentadoria, quando concedida em desacordo com a lei, não ofende o princípio da irredutibilidade de vencimentos. Precedentes. 5. Segurança denegada. (MS 25552, Relator (a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno 07/04/2008).”


Também com base na mesma premissa, o STF, ao editar a Súmula Vinculante nº 3º, trouxe uma ressalva ao final da sua redação, quanto à necessidade de observância do direito ao contraditório e à ampla defesa na apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria pelo Tribunal de Contas.

Súmula Vinculante nº 3: Nos processos perante o tribunal de contas da união asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão.


De acordo com esta súmula, devem ser assegurados aos jurisdicionados o contraditório e a ampla defesa nos processos perante o Tribunal de Contas quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, EXCETUADO O ATO DE CONCESSÃO INICIAL DE APOSENTADORIA.  Este, por ainda não estar perfeito e acabado ante a não confirmação pelo Tribunal de Contas (ato administrativo complexo, como vimos), não exigiria a observância do contraditório e da ampla defesa, ainda que a apreciação da legalidade pelo Tribunal de Contas pudesse resultar a extinção do ato.

Sendo assim, à luz da Súmula Vinculante nº 3, não há que se falar em violação ao contraditório ou à ampla defesa quando do cancelamento do benefício de Maria determinado pelo TCE.


No entanto, convém fazer uma observação sobre o tema, em virtude de recente jurisprudência do STF. Como muitas vezes o Tribunal de Contas demora a confirmar o ato de aposentadoria, surgiram situações em que o antigo servidor já tinha começado a gozar da aposentadoria desde a concessão pelo seu órgão, mas a mesma veio a ser cancelada muitos anos depois, sem a observância do contraditório e da ampla defesa, com base na SV nº 3. Este quadro de instabilidade e insegurança jurídica levou o STF a mitigar o entendimento estabelecido na referida Súmula Vinculante.

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ILEGITIMIDADE DO COORDENADOR-GERAL DE RECURSOS HUMANOS DO MINISTÉRIO DOS TRANSPORTES. NEGATIVA DE REGISTRO A PENSÃO. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. 1. O Coordenador-Geral de Recursos Humanos do Ministério dos Transportes é parte ilegítima para figurar no pólo passivo da ação mandamental, dado que é mero executor da decisão emanada do Tribunal de Contas da União. 2. A inércia da Corte de Contas, por mais de cinco anos, a contar da pensão, consolidou afirmativamente a expectativa de pensionista quanto ao recebimento de verba de caráter alimentar. Esse aspecto temporal diz intimamente com: a) o princípio da segurança jurídica, projeção objetiva do princípio da dignidade da pessoa humana e elemento conceitual do Estado de Direito; b) a lealdade, um dos conteúdos do princípio constitucional da moralidade administrativa (caput do art. 37). São de se reconhecer, portanto, certas situações jurídicas subjetivas ante o Poder Público, mormente quando tais situações se formalizam por ato de qualquer das instâncias administrativas desse Poder, como se dá com o ato formal de aposentadoria. 3. A manifestação do órgão constitucional de controle externo há de se formalizar em tempo que não desborde das pautas elementares da razoabilidade. Todo o Direito Positivo é permeado por essa preocupação com o tempo enquanto figura jurídica, para que sua prolongada passagem em aberto não opere como fator de séria instabilidade intersubjetiva ou mesmo intergrupal. A própria Constituição Federal de 1988 dá conta de institutos que têm no perfazimento de um certo lapso temporal a sua própria razão de ser. Pelo que existe uma espécie de tempo constitucional médio que resume em si, objetivamente, o desejado critério da razoabilidade. Tempo que é de cinco anos (inciso XXIX do art. 7º e arts. 183 e 191 da CF; bem como art. 19 do ADCT). 4. O prazo de cinco anos é de ser aplicado aos processos de contas que tenham por objeto o exame de legalidade dos atos concessivos de aposentadorias, reformas e pensões. Transcorrido in albis o interregno qüinqüenal, a contar da pensão, é de se convocar os particulares para participarem do processo de seu interesse, a fim de desfrutar das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa (inciso LV do art. 5º). 5. Segurança concedida.

Assim, de acordo com o atual entendimento do STF, se o Tribunal de Contas demorar mais do que 5 anos para examinar a legalidade do ato administrativo de concessão inicial da aposentadoria, deve ser respeitado o contraditório e a ampla defesa, assegurando-se ao servidor potencialmente prejudicado o direito de manifestar-se.

Esquematizando a resposta à questão, temos que: